Carla Andrino – Obrigado filhos por estes presentes

Nesta 2º parte da conversa, que os Retratos Contados tiveram com a recente mamã Marta Andrino e com a avô babada Carla Andrino,  ficamos a saber do amor que esta família tem por objectos que vão passando de geração em geração.

 

Mãe e filha, partilham com todos a emoção que foi saberem da novidade da chegada de 2 bebés com 4 meses de diferença.

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RC: Então a avó e as bisavós fazem botinhas de lã?

 

MA: As bisavós sim, a avó não.

 

CA: Não sou muito dada a trabalhos manuais. Se fosse, faria.

 

RC: Ouvi dizer que recuperaste os quartos que eram deles?

 

CA: Sim, as camas, alguns móveis, os bonecos de peluche, o berço deles… A única coisa que fiz foi pintar tudo de branco.

 

RC: Isso foi pensado a vida inteira, ou simplesmente aconteceu?

 

CA: No fundo foi pensado a vida inteira, porque quando eu disse “não quero nunca desfazer-me disto” se calhar… Sim, por que é que eu guardei aquilo? Agora que me perguntas, sim no fundo foi! Acho que sempre me projectei no futuro.

 

RC: Uma pergunta provocatória, e se eles não quisessem?

 

CA: Se eles não quisessem não faria nada disto! Só se faz porque os filhos também o querem! Não é por ser avó, ou mãe, que tenho poder sobre!

 

RC: Embora já imaginasse a resposta, estava a provocar-te porque há aquelas mães que gostavam que as filhas casassem com o vestido de noiva que já tinha sido da mãe e da avó…

 

CA: E depois a filha não quer!

 

RC: E há umas que acham muito ofensivo e outras não. Conhecendo-te como te conheço, tu não acharias!

 

CA: Não! Se a minha filha ou o meu filho dissessem “mãe é muito lindo, adoro a ideia, achei muito querido mas já temos outro bercinho”, usavam o que quisessem e ponto final! Não há que levar a mal!

 

RC: Marta, estavas a dizer que as tuas bisavós fazem botinhas de lã …

 

MA: Sim, uma fez as botinhas e os casaquinhos, a outra fez uma mantinha. Mas não são avós de fazer aquele enxoval à antiga! Elas próprias ficam encantadas se passarem numa lojinha para comprar um baby-grow ou qualquer coisa… Mas eu gosto muito das coisas antigas, eu procuro muito esse tipo de recordações. Gosto muito de reutilizar as coisas, seja o berço que neste caso faz todo o sentido, ou roupas antigas… são coisas com as quais me identifico. Mesmo na decoração da casa. Continuo a montar a minha casa e as minhas avós deram-me as cadeiras que elas tinham a mais e eu gosto, não faço questão de ir comprar novo. E depois peço-lhes permissão para as restaurar: “Olha vou levar, mas vai ficar de outra cor!”.

 

RC: Com essa filosofia de vida, juntamente com esses objectos, também se herda um pouco a história e a alma desses mesmos objectos, não é?

 

MA: Sem dúvida! Há coisas antigas que não perdem qualidade. São coisas com anos e que continuam “rijas”. Tenho cadeiras em casa com 50 anos que estão impecáveis e todos continuam a sentar-se nelas.

 

CA: Mas isto, nitidamente, a Marta herdou do pai. Eu também sou assim, mas o pai… 70% das coisas que estão nesta casa são do avô, de um bisavô, de uma tia-avó…. Aquela mesa custou 100 escudos, e era onde comia o pai do Mário e os 6 irmãos. Aquela mesa tem literalmente cento e tal anos. Podíamos ir comprar uma mesa branca, disto ou daquilo, mas não era aquela mesa.

 

RC: Tens uma casa cheia de história quando podias ter uma casa cheia de coisas caríssimas, mas que não tinham história nenhuma.

 

CA: Caríssimas ou baratíssimas, mas sem história! Quase todas as coisas que estão cá em casa têm história.

 

MA: Prefiro ser eu a fazer do que comprar feito porque tenho muito gosto!

 

RC: A tua casa está cheia de objectos com histórias que vais passar aos teus netos, que por sua vez vão passar aos netos deles… Essa herança é fabulosa!

 

CA: E o mais engraçado é ver o que eu posso proporcionar ao meu sogro, neste caso com 83 anos, que comeu naquela mesa desde que se lembra. Ele chega aqui a uma festa, um almoço ou um jantar, pois não há vez nenhuma que não diga “Ah! Esta mesa custou 100$! Comi nesta mesa tinha eu dois aninhos!”. Ora dois aninhos, foi há oitenta. E chega dali a quinze dias para jantar ou almoçar e volta a dizer: “Esta mesa…”. E a gratidão que ele tem, porque entretanto mudamos de casa, a casa é maior, é mais pequena já não dão as coisas e não sei o quê. A nossa casa é grande mas também não é pela casa ser grande, porque eu podia ter uma casa grande e não querer ter estas coisas, são madeiras nobres mas que agora são escuras, pesadas e podia não as querer na minha casa. Aquele Santo António, aqueles aparadores têm 200 anos, quem é que quer aquilo? Pois mas eu quero! Pronto as pessoas vão desaparecendo e depois quem é que quer?

 

MA: Hoje em dia, nas ruas, nas zonas onde a população é mais idosa, à beira do lixo, de repente vêem-se camas, roupeiros antigos… Por alguma razão as famílias não querem os móveis e acaba por ir tudo para o lixo.

 

CA: Às vezes é porque as casas não comportam, outras, é porque não querem as coisas por as considerarem velharias.

 

RC: Sim, em Lisboa por exemplo vê-se que existem muitas casas que vagam e há coisas que ficam nessas casas. Depois quem vai para lá também não quer lá as coisas e aquilo acaba por ir para o lixo.

 

MA: Mas nota-se logo quando são móveis recentes e estão à beira do lixo ou quando são as coisas antigas.

 

CA: E a Marta às vezes zanga-se comigo e com muita razão. Ontem foi um dia destes, andámos aqui com mudanças e ela zangou-se: “Esta casa está cheia”! Pois eu percebo, mas depois eu farto-me de rir com ela e digo-lhe: “Eu quero ver a tua casa daqui a uns tempos”… porque lá está, depois “ah tão giro era do avô, ah tão giro era da tia”, é tudo bonito. Temos cadeiras lá em baixo onde se sentou durante anos e anos uma tia do meu marido que eu adorava, uma tia-avó da Marta, irmã do meu sogro que eu amei de paixão e que morreu há poucos anos, solteira, e que durante anos e anos e anos, 50 anos sei lá, sentou-se naquele sofá. E depois a senhora foi para o céu, com certeza absoluta, e o sofá estava todo velho e roto! “Então dêem-me cá o sofá” e pus umas molas novas e forrei-o e dá-me gozo sentar naquele sofá, claro que estava ruço e gasto e era mais fácil ir para o lixo. Se calhar gastei mais dinheiro do que se tivesse ido comprar um novo, mas não tem aquela história, não tem aquela alma! E pronto, lá está o sofá em baixo e aquilo dá-me um gozo!!!

 

RC: Então e a família do Frederico, como é que está a viver a gravidez?

 

MA: Estão entusiasmados! Distantes, mas tentam acompanhar o mais possível. Acabo por ter uma família nos Açores à nossa espera!

 

RC: Vivem em que ilha?

 

MA: São Miguel. É incrível, já tenho saudades! Já fui conhecer São Miguel, Pico, São Jorge e Santa Maria, tudo com o Frederico. E é diferente quando se vai com alguém nativo, digamos assim. Ele é um belo anfitrião. A minha mãe já lá tinha gravado uma novela. E, quando se chega lá, mesmo já tendo visto imagens, a terra consegue surpreender-nos. É incrível o que aquela natureza nos dá. E também fico muito contente que o meu filho vá aos Açores usufruir dessa genética, que tenha sangue de lá, porque o Frederico é muito agarrado às raízes e sempre que pudermos vamos lá dar um salto.

 

RC: E ele, adaptou-se bem ao continente?

 

MA: Ele já cá está quase há tantos anos como os que viveu em São Miguel, portanto sim já, já é também muito continental embora as origens dele prevaleçam. Sempre que fala dos Açores tem um brilho nos olhos e sente imenso orgulho em ter sotaque, embora já muito ténue, porque como ator tem que o saber anular e consegue-o perfeitamente. E gosta muito de viver aqui, para estarmos próximos dos meus pais e destas ajudas agora necessárias, vivemos perto de Sintra e adaptou-se muito bem.

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RC: Como têm convido as tuas amigas contigo nesta fase mágica da tua vida? Conselhos … sobre o enxoval …?

 

MA: Eu tenho tido muitas ajudas de todos os lados, as minhas amigas as que já foram mães dizem “o que precisares leva” porque de facto há um consumismo inerente à maternidade que é imediato, há uma necessidade ou uma vontade de dar logo o melhor aos nossos filhos, mas que depois é de curta duração, é só de semanas, às vezes não se chega a vestir e elas por experiência própria passaram-me isso e disseram “olha tenho coisas impecáveis e gostava que ele viesse a vestir”. As que ainda não foram mães enchem-nos de mimos e já quiseram oferecer a bolsinha dos documentos, a almofada de amamentação… E o engraçado, é que tenho amigas que já foram mães e outras que ainda não, e acabo por ser das primeiras, e então gostam muito de estar presentes em todos os momentos e estão muito entusiasmadas, querem acompanhar todos os passos e querem senti-lo. Tenho estas amigas há muitos anos…

 

CA: São do berçário, algumas são amigas de berçário, mesmo!

 

MA: E acho graça porque elas estão sempre a dizer “então como é que está o meu sobrinho”? e então mando-lhes as fotografias das ecografias, com todos os dados novos… São muito participativas. Isto para dizer que o enxoval tem vindo um bocadinho de todo o lado. Antigamente se calhar preparava-se um malão com tudo dos avós, dos pais… Comigo tem sido um bocadinho de todos os lados, inclusivamente até do meu sobrinho, que com o avançar dos meses há coisas que já deixaram de lhe servir e lá vem o meu irmão com um saquinho com roupa para o sobrinho que ai vem. Claro que depois há coisas que quis comprar ou que quis ir buscar da minha gavetinha de bebé.

 

RC: Marta, foste tia há cerca de 4 meses. Como é que foi tornares-te tia?

 

MA: É incrível! Há uma frase que diz que “Ser tia é o melhor presente que o teu irmão te pode dar”, e é verdade. Já tinha sido tia por afinidade dos filhos das minhas amigas, mas de facto ser de sangue é assim uma emoção inexplicável… E ver o meu irmão a ser pai, a emoção que ele transborda a olhar para o miúdo é indescritível, é incrível saber que ele também é do meu sangue. E imaginar o que vão partilhar juntos, como primos, e tê-lo ao colo muitas vezes aqui com o meu bebé na barriga é incrível! Adoro!

 

RC: É extraordinário vocês viverem uma gravidez tão próximos um do outro não é? É uma cumplicidade?

 

MA: Sim, quando às vezes, meio disparatadamente ou a brincar, nos perguntam: “combinaram?”. Claro que não combinámos, estas coisas por mais que sejam programadas, não dá para planear, nós vamos tentando a nossa sorte. E muitas vezes há casais que ficam imenso tempo sem conseguir, outros são mais rápidos. Portanto, é sempre um planear relativo, muito menos planear com o meu irmão, foi mero acaso. Aliás quando eu dei a notícia à família, primeiro acharam que eu estava a brincar porque uns meses antes o meu irmão tinha dado a notícia e de repente eu também dou, logo a seguir, ficou tudo boquiaberto mas acabou por ser muito engraçado.

 

RC: Vocês têm uma diferença de quanto tempo?

 

MA: Dois anos.

 

CA: Mas sempre foram irmãos muito cúmplices portanto, embora não tivessem combinado, como estava a dizer a Marta, só revela a simbiose em que eles se encontram. Aliás, quando ela me disse foi divertidíssimo porque eu não percebi, eu que até acho que sou uma mulher perspicaz. Ela disse-me: “Ó mãe vão ser dois!” E como a minha nora estava praticamente de quatro meses pensei que fossem gémeos. Mas a Catarina tinha feito uma ecografia e tinha dado um, só batia um coração, e eu disse “Dois? Então vai ter gémeos, mas a ecografia só tinha dado um …!” Começo a ver a cara da Marta e eu… “Então, mas não é ela que vai ter dois, tu é que também vais ter um!”. Olha, tudo a chorar. Eu não queria acreditar, parecia brincadeira! Os dois filhos grávidos ao mesmo tempo, não é o máximo?

 

RC: Ser avó era algo que tu já desejavas há muito tempo?

 

CA: Ah! Há muito tempo, aliás eles dizem: “não querias netos, no plural? então toma dois para brincares!”

 

RC: E enjoos, nada?

 

MA: Não nada, não enjoo nada. Aliás, enjoei apenas no início. O primeiro mês senti uma adaptação, a grávida fica com os sentidos muito mais despertos, e disseram-me que isso acontece para não comermos nada estragado! Ou seja, estamos com os sentidos muito mais apurados e, por isso, os cheiros ficam mais fortes e intensos. A única coisa que enjoei foi o cheiro do detergente da roupa, mas de comida não. Tinha às vezes assim umas indisposições, que percebia que faziam parte de uma adaptação física, transformações que o meu corpo estava a sofrer. Mas não eram vómitos, nem náuseas, eram uns desconfortos. Nem nunca perdi o apetite, pelo contrário, havia dias que sentia como se tivesse corrido a maratona, estava sempre com fome. Mas isto só no início, talvez nas primeiras três semanas. E depois passou, tal como veio foi. Foi mesmo só a evolução do corpo que fui sentindo, vão-se sentindo as várias mudanças ao longo dos meses, não só a barriga a ficar evidente. A mulher olha-se ao espelho e desde cedo começa logo a ver outro corpo e foi essa mudança que eu fui sentindo mais. Estive sempre muito atenta porque quis sempre ver e sentir os sinais todos. Quando me disseram “um dia quando sentires o bebé, por volta dos quatro meses, é como se fossem umas borbulhinhas, aqui em baixo”, então ainda estava mais atenta aos sinais para não deixar passar. E porque sempre quis ser mãe nova e a minha mãe sempre quis desde cedo ser avó porque foi mãe aos 20. Aliás ainda se ponderou virmos a ter mais irmãos, quando eu tinha 15 e o meu irmão tinha 13, porque a minha mãe tinha 35 anos, mas optou por esperar pelos netos. E hoje é uma avó super jovem, embora o convencional estatuto de avó é já ter cabelos brancos…

 

RC: Mas essa imagem hoje em dia está desconstruída!

 

CA: Pois está, e eu não estou nada preocupada!

 

RC: É um privilégio muito grande a Marta ter os avós vivos, cheios de saúde e genica. Esses avós tornaram-se agora bisavós e tu Carla tens uma vida (apesar de muito ocupada…), mas uma grande perspectiva de vida ainda pela frente para teres tempo de seres avó e desfrutares de tudo o que a vida te queira proporcionar.

 

CA: Ah, eu vou desfrutar de tudo, tudo! Quero desfrutar e curtir estes momentos. Quero estar com a minha filha e tenho estado muito com o bebé da minha filha. Sim porque isto é estar, ele está presente, está a ouvir… E também tenho estado muito com o meu outro bebé, o meu neto Henrique. Temos estado todos muito, ainda ontem cá estivemos todos juntos.

 

RC: E como é que tem sido o Henrique? Sossegadinho?

 

CA: Muito sossegadinho, é um espectáculo! Só espero é que o primo…

 

MA: Nós dizemos sempre que o primo vai ser o terrorista!

 

CA: Vai ser o terrorista que vai desafiar o outro!

 

MA: Eu e a Catarina, a minha cunhada, falamos sobre como é que eles foram dentro da barriga e o Henrique foi mais calmo, portanto, dizemos que ele cá fora é que vai puxar pelo primo.

 

RC: Estávamos a falar da vontade que já sentias há muito tempo de ser avó …

 

CA: Sim, gostava porque, como a Marta estava a dizer, fui mãe aos 20. Depois, via-os crescidos e muito maduros emocionalmente, com relações amorosas bonitas e muito seguros. São pessoas estruturadas e orgulho-me muito destes filhos! De facto, quando me dizem: “Que sorte que tens com os teus filhos”, não, não é sorte, é investimento! Não é trabalho, é investimento, todos os dias se educa, mesmo agora com 28 e 26. Sou mãe, compete-me educar.

RC: Seres avó agora aos 48 anos é completamente diferente do que seres aos 68 anos?

 

CA: Não sei! Ninguém sabe o que vai acontecer mas, à partida, vou ter mais tempo para gozá-los!

 

RC: Conta-nos como é que foi a tua reação, quando o teu filho disse que ias ser avó?

 

CA: Dei um grito de felicidade!

 

RC: E foi dito como? Em família?

 

CA: Foi dito em família, sim! Eles reuniram a família toda e disseram. Foi um momento muito bonito.

 

RC: E a Marta, aí ainda nem sequer sonhava…

 

CA: Também queria ser mãe mas…e foi 4 meses depois.

 

RC: Outra vez uma reunião familiar?

 

CA: Ela disse logo ao irmão, lá está a tal cumplicidade. Depois disse-nos.

 

RC: Então os teus filhos sempre foram muito cumplicies e esta dupla bênção espelha bem essa cumplicidade não é?

 

CA: É, é! Sem dúvida!

 

RC: Vais mover montanhas para que os teus netos sejam tão cúmplices como foram os pais?

 

CA: Eu não movo montanhas, vou fazer a minha parte, dar o meu contributo! Não posso, nem devo, fazer a parte dos outros sob pena de não deixar que os outros tenham espaço! Como em tudo, em qualquer relação eu faço a minha parte e espero que tu faças a tua porque se não, eu passo-te um atestado de incompetência. Então que espaço é que tens para me mostrares aquilo que tens para me dar? Se eu faço por mim e faço por ti? Muitas das confusões e desentendimentos que há entre as pessoas, é quando queres ter o espaço todo, eu faço por ti e pelo outro, a atitude em si parece muito nobre e de uma dádiva gigantesca… Parece! Eu não sei é onde é que fica depois espaço para o outro. Onde é que tu podes mostrar as tuas virtudes, as tuas fraquezas, os teus medos. Portanto, vou fazer a minha parte e esperar que os meus filhos e netos façam a parte deles. Sempre que precisarem vou estar aqui!

 

RC: E que valores queres transmitir-lhes?

 

CA: Não preciso de transmitir verbalmente, basta sê-lo! Mais do que dizer, acho que nós aprendemos a ver. O melhor exemplo é aquilo que faço, mais do que aquilo que digo. Não adianta dizer trinta vezes “Não se rouba, não se rouba porque não é nosso…” e depois, um dia, chego ao supermercado e roubo uma caixa de pastilhas! O que vai acontecer é que me habilito a que, passado uns tempos, o meu filho ou o meu neto faça o mesmo. E aí cai por terra todas as vezes que disse que não se rouba! Ou seja, ele vai valorizar muito mais aquilo que eu fiz do que aquilo que eu lhe disse. Portanto, acho que não tenho que lhes dizer muita coisa, tenho é que fazer. Para o bem ou para o mal, serei um exemplo!

 

RC: É essa a herança que lhes queres passar?

 

CA: É isto que vou continuar a fazer e espero que eles tirem o melhor para eles.

 

RC: Há praticamente quatro meses viste o teu neto Henrique pela primeira vez. Consegues transmitir por palavras essa emoção?

 

CA: Não há palavras! É uma imagem e sensação que fica para sempre, mas que não se consegue explicar.

 

RC: Consegues fazer um pequeno resumo de como é que têm sido estes três meses? O que é que mudou na tua vida?

 

CA: Mudou tudo e ao mesmo tempo não mudou nada! Quer dizer, mudou tudo porque é um novo ser que chega. Não mudou nada porque eu sou uma mulher de afetos, sou uma mulher emotiva, sou uma mulher de família e portanto o que mudou, é que chegou mais um elemento à família. E agora tenho mais uma pessoa para amar, mais uma alegria e, provavelmente, também terei mais uma preocupação. Tenho mais tudo!

 

RC: Então e os outros bisavós, como é que eles estão neste momento?

 

CA: Estão todos muito contentes a viver esta fase, para eles então é um rejuvenescimento. Se para mim já é tão encantador ver o filho do filho, calculo o que seja para eles ver o filho do filho do filho, não é? Ver o filho do neto é mágico! Que vida que se vive, que privilégio!

 

RC: Os teus netos com uma avó actriz, um avô maestro, uma tia (Marta) actriz e um tio (Frederico) actor, quer dizer alguma coisa no futuro?

 

CA: Vamos ver! Pode ter a ver, ou não.

 

RC: E se for essa a vontade deles?

 

CA: É a vontade deles! Quando a Marta me disse que queria ser actriz eu fiquei felicíssima, “se é isso que tu queres…! E se é para ser que sejas bom, com muito respeito, com dignidade, com muita humildade”. Nós como pais não influenciámos para os filhos seguirem, ou não, o que quer que seja. Com os netos será igual!

 

RC: Como é que vai ser o natal este ano?

 

CA: Com mais dois elementos! Portanto, este natal não tenho um menino Jesus, tenho três: é o menino Jesus e os meus netos, que vão ser o “Ai Jesus” do menino Jesus.

 

RC: Daqui a muitos anos quando já não estiveres nesta dimensão, e eles estiverem a falar dos avós aos filhos deles o que gostarias que eles recordassem de ti?

 

CA: Isso é uma coisa que está muito clara na minha cabeça! Eu gostava que eles me recordassem como aquela que sempre amou muito! Eu vim para aqui para amar! Há pessoas que gostam de se chatear, que gostam de ter problemas, que inventam problemas. Há pessoas que gostam de manter o problema e quem sabe até aumentá-lo. Há outras que têm problemas e gostam de os resolver. Eu sou do resolver! Eu gosto de gostar, gosto de amar. Eu gosto de viver, gosto de amar, gosto de ser amada. Eu vim cá para amar!

 

RC: Portanto aquele ditado tão português “Esta é a nossa cruz” ou “É a minha cruz”, tu não tens essa cruz?

 

CA: Não! A minha cruz é amar, com tudo o que isso implica. Quem ama muito sofre muito, sofre na proporção em que ama. Mas olha, sofro por uma boa causa.

 

RC: A avó Carla Andrino quer acrescentar alguma coisa?

 

CA: Obrigada Filhos por estes presentes!