
Uma Vida Plena de Tudo
Manuel Pinto – 20 de março 2023
Um belíssimo texto de homenagem a Alice Vieira no dia do seu 80ª aniversário.
UMA VIDA PLENA DE TUDO
Abrem-se os tempos a uma nova Era
Na véspera do Equinócio da Primavera
E do Dia Mundial da Poesia.
Será um bom momento para homenagear
Quem ainda muito irá revelar
Mesmo depois de Ápeiron, com alegria,
A receber em seu infinito lar.
Estou a falar de alguém
Que até hoje pouco referi.
Mas que do “Sangue das Palavras de Ary”
Fez surgir a “Estrela da Tarde”,
Inspiradora de todos aqueles que, de nós,
Jovens e adultos, netos e avós,
Todos a quem o fogo no coração arde
Ao ouvir Carlos do Carmo,
Sem queimar sarça ou ramo.
De espírito aberto e solidário
Muitos e grandes prémios arrecadou,
Pois deles merecedora foi e a tornou
Em Comendadora e Grande-Oficial.
Mãe e avó babada,
Mulher de grande “Audácia”,
Escritora de livros, revistas e jornais,
Tocando fundo netos, filhos e pais.
Escrevendo em mil línguas diferentes,
Com mensagens para todas as gentes,
Foi de Torres Novas para Lisboa,
Arrecadando recordações de Caldelas
Que a tornou numa jornalista de primeira
A tentar descansar na Ericeira.
Quando pessoalmente a conheci
Nem precisei nem de “Meia Hora
Para Mudar a Minha Vida”,
Mesmo tendo começado a ouvir
“Um Estranho Barulho de Asas”
Que me fez de imediato pensar
Sobre “O que Sabem os Pássaros”.
Perguntei-lhe onde a encontrar,
E ela diz-me, como quem “Desanda Cacete”:
-“Se Perguntarem por Mim,
Digam que Voei” em busca
Da “Charada da Bicharada”
E das “Moedas de Ouro do Pinto Pintão”.
Ah! “Se Houvesse Limão”, contaria a história
Da “Trisavó de Pistola à Cinta e Outras Histórias”,
“Duas Histórias de Natal”
E “Contos e Lendas de Macau”.
– Mas quem nunca me saiu da cabeça –
Dizia Alice com o seu sorridente olhar -,
Era a “Rosa, Minha Irmã Rosa”,
Que muito acompanhava “Paulina ao Piano”
E faziam “Rimas Perfeitas, Imperfeitas e Mais-que-Perfeitas”
Quando morávamos no “Lote 12, 2º Frente”
E comíamos “Chocolate à Chuva”
Quando caíam as “Águas de Verão”
E enchíamos o “Caderno de Agosto”
Ao escolhermos “Um Nome para Setembro”.
Olhando “Esta Lisboa” de “Bica Escaldada”,
Com “Pezinhos de Coentrada”
E “Dois Corpos Tombando na Água” do “Tejo”,
Nada há que a afoite.
“Só Duas Coisas que, entre tantas, me afligiram”:
– Saber “O que dói às Aves”
E “Os Armários da Noite”.
Dizia ela: -“Eu bem vi Nascer o Sol”
Nas “Praias de Portugal”,
Sabendo “O que se leva desta Vida”.
Como diziam “Os Profetas”
Do “Mundo de Enid Blyton”,
Só podemos ler “O Livro da Avó Alice”
Devido ao facto “De Estarmos Vivos”.
E, no meio dos “Contos de Grimm
Para Meninos Valentes”,
Ou dos “Contos de Andersen
Para Crianças Sem Medo”,
Surgiram “Contos de Perrault
Para Crianças Aventureiras”,
Pois pior que encontrar “O Anjo com Barbas”
Ou “O Gigante e Três Irmãs”,
Seria encontrar “Os Anéis do Diabo”
Ou “O Filho do Demónio”.
Por isso, tinha sempre a estante cheia
De “Livros com Cheiro a Chocolate,
A Morango e a Baunilha,
A Caramelo, Canela e Banana”.
Era como se tivesse encontrado
A famosa “Arca do Tesouro”,
Seguindo “Um Fio de Fumo
Nos Confins do Mar”.
Lembrava-se, muito bem, de ter escrito
O “Diário de Um Adolescente na Lisboa de 1910”,
Do seu “Primeiro D. Quixote”,
De ter comido “A Sopa de Pedra”
E de lhe ter aparecido, de repente,
“Um Ladrão Debaixo da Cama”,
Pelo que teve de tomar
“13 Gotas ao Deitar”.
Certo dia foi ao teatro ouvir um coro
De “Vinte e Cinco a Sete Vozes”,
Onde, de vez em quando,
Surgiam “Expressões com História”.
– “Lindo, lindíssimo!” – gritou ela tão alto
Que fez arregalar os enormes olhos
Da “Misteriosa Mulher da Ópera”.
A ida com “A Maria das Silvas”
Ver o “Periquinho e a Periquinha”
E “As Três Fiandeiras”,
Tornou-se “Picante (como) Histórias que Ardem na Boca”,
Pelo que lhe apetecia sempre comer
Um pedaço de “Chocolate”, enquanto ouvia
“Histórias de Ler e Chorar por Mais”.
“Eç’Agora!” – pensou ela,
Se consigo escrever “O Código d’Avintes”,
Também conseguirei escrever
Os “Novos Mistérios de Sintra”.
Mas, o que eu queria mesmo
Era escrever o “Diário de Uma Avó e do Neto”,
E dizer-lhe, olhos nos olhos:
-“Olha-me Como Quem Chove!”
Quando conheceu “O Menino da Lua”,
Soube que “A Lua não está à Venda”,
Pois, mesmo que nos sentemos no “Promontório da Lua”,
“Às Dez a Porta Fecha” e ninguém mais cheirará
A “Flor de Mel”, nem mesmo “Este Rei que Eu Escolhi”,
Traga ele ou não “A Espada do Rei Afonso”,
Ou que faça uma “Viagem à Roda do Meu Nome”.
É que, apesar de ser “O Tempo da Promessa”
Haverá sempre, quer se queira, quer não,
“Graças e Desgraças na Côrte de El Rei Tadinho”
E ninguém decifrará “A Adivinha do Rei”,
Mesmo que tenha “Fita, Pente e Espelho”
Nas “Mãos de Lam Seng”,
Pois virá “O Sapateiro” com o seu “Pássaro Verde”,
Contando histórias de “Leandro, Rei da Helíria”
E “A Verdadeira História do Doutor Grilo”.
Quando fez passar “Macau: Da Lenda à História”,
“Os Olhos de Ana Marta” viram “Úrsula, a Maior”,
Bem como “O Coelhinho Branquinho e a Formiga Rabiga”,
E gritou: -“Corre, corre, Cabacinha”,
Correndo, também, a proteger-se
Junto das “Árvores que Ninguém Separa”.
Um dia decidiu ir passear
Com “A Machadinha e a Menina Tonta”.
Depois foram ler “O Meu Primeiro Álbum de Poesia”,
Perguntando-lhe, no fim:
– “A Que Sabe Esta História?”
E respondeu-lhe “A Bela Moura”:
– Parecem “Histórias da Bíblia”
Saídas da “Caixa Velha”
Ou “Contos das Mil e Uma Noites”.
Quando o “João Grão de Milho” encontrou
O “Rato do Campo e o Rato da Cidade”,
Contaram “Histórias e Canções em 4 Estações”
E “Manhas e Patranhas, Ovos e Castanhas”,
O que obrigou Alice a escrever
Sobre “A Vida nas Palavras de Inês Tavares”,
Levando ao “Casamento da Minha Mãe”
Uma “Fita Cor-de-Rosa”
E um “Cordão Dourado”.
E embora ela só não goste
Daquilo que não está na mesa,
Uns enchidos tansmontanos
Satisfazem-na, de certeza.
As francesinhas do Porto
E outros acepipes do Norte
Dão-lhe garra e alegria,
Tornando-a ainda mais forte.
Sofreu inúmeras perdas na vida,
Entre as quais duas enormes
E outra perdas menores.
Mas, apesar de tão sofrida,
Tenta ocultar suas dores.
Parecendo muito resistente por fora,
É “manteiga no Verão” por dentro,
Pois o seu coração é enorme
E o o seu pensamento em voo
É livre como é o vento.
De sorriso rasgado
E gargalhada desgarrada,
Pouco liga a convenções.
Isso justifica o seu passado
De uma vida acelerada
E sempre plena de emoções.
Não consigo imaginar, sequer,
Onde é que esta linda mulher
Consegue tanta vitalidade.
É uma eterna gaiata
De reação imediata,
Distribuindo mocidade.
Há cerca de um ano atrás,
E sobre a sua idade
Com o riso que a alenta,
Cheia de orgulho e energia
E com a sua mocidade,
Disse-me com toda a alegria
E com a certeza que a move:
“- Nem setenta e oito, nem setenta e nove…
»- Para o ano faço oitenta…!”
Cumpriu a sua promessa
E, de coração em coração,
De salão em salão,
De exposição em exposição,
De televisão em televisão,
De livro na mão,
Aí vai ela,
Sempre jovem e bela,
Mostrando a sua juventude
À juventude
Que não sabe quanto é bom
Viver com o coração.
E, chegar aos oitenta anos,
Com espírito de uma criança
Que na infância balança
Como se tivesse apenas oito anos,
Mantém-na sempre jovem,
Mantém-na sempre menina…
Fazendo dela a sempre nossa
“Invicta” e eterna heroína…
Muitos parabéns, Alicinha…!