“Há pessoas assim. Não tantas como precisaríamos…”

Alice Vieira

Quero lembrar-me do dia (mês, ano): exacto em que conheci o Luís, mas não consigo!

Mas há dois momentos que nunca esqueço.

Quando descobri que era filho do grande fadista António Osório, muito nosso amigo e que vinha muito cá a casa; e no dia em que ele, no âmbito de entrevistas que tinha num jornal, em que punha frente a frente pessoas que não se falavam,ou estavam zangadas, ou separadas por motivos políticos. E foi assim que eu fiquei amiga da Isabel do Carmo até hoje…

POSTAL DO DIA – Luís Osório

Alice Vieira foi abandonada

(mas soube oferecer ao mundo o que nunca teve)

1.

Alice Vieira celebrou neste ano o 40º aniversário da edição do seu primeiro livro, “Rosa, minha irmã Rosa”. Ela é o nome maior da literatura infantil e juvenil portuguesa das últimas décadas. Tantas e tantas vezes deslocou-se graciosamente a escolas e a todos os lugares onde existiam crianças para a ouvir falar sobre os livros.

2.

Alice foi abandonada pela mãe quando tinha 15 dias. “Não era pobre nem mãe solteira” como no sábado a Alice comentou na minha página, a mãe deu-a a quem melhor pudesse cuidar dela. E foi à sua vida. A Alice ficou sem mãe, desamparada de afetos. Cresceu com tios-avós. Sozinha na maior parte do tempo. Sem os abraços que merecia. Que merecem todas as crianças. Sem a rede que todas precisam tinha tudo para falhar…

mas não falhou.

Mais do que isso, ofereceu ao mundo o que lhe faltava. E dedicou-se à escrita e a crianças a quem influenciou, amparou e ofereceu rede. A rede que nunca teve. O afeto e amparo que nunca teve.

Ousou caminhar contra o destino. Preferiu construir-se rodeada de pessoas por todos os lados, de amigos, de gerações de portugueses que começaram a ler por terem caminhado nos seus livros.

3.

Há pessoas assim. Não tantas como precisaríamos, mas há. Passam pela vida como se voassem acima dos nossos pés. Atrevem-se a fazer tudo ao contrário do que imaginávamos ser possível. Mandela saiu da prisão e em vez de ódio ofereceu ao mundo compaixão. Alice Vieira nunca teve uma mãe e em vez de lhe terem nascido ervas daninhas sobrou-lhe uma enorme vontade de poder ser mãe de todas as crianças. Uma espécie de mãe feita de palavras, feita de perguntas para perguntar e de sonhos para serem sonhados.

Não há destino melhor do que aquele que tiveste, querida Alice. Mesmo que chores todos os dias até à eternidade.