“APRENDI A FAZER PIADAS PARA ALIVIAR O LUTO DA MINHA AVÓ”

Os Retratos Contados foram passear ao Zoo de Lisboa com a família de Sónia Morais Santos, autora do Cocó na Fralda, um dos blogues de mais sucesso do mundo virtual, agora na plataforma SAPO. Esta é a primeira parte da nossa conversa.

Ela tem um blogue e três livros publicados (O Melhor do Mundo, Cocó na Fralda e A Culpa Não é Sempre da Mãe). Tem quatro filhos, o Manuel com 13 anos, o Martim com 9, a Madalena com 5, e o benjamim Mateus, com quase 6 meses.

[dt_small_photos height=”280″ padding=”0″ arrows=”light” show_title=”” show_excerpt=”” number=”30″ loop=”” orderby=”recent” category=”zoo-delisboa”]

Sónia, fale-nos dos seu avós paternos e maternos.

Sónia Morais Santos: Os meus avós paternos eram o Joaquim e a Aida. Tive pouca relação com eles. Os meus pais divorciaram-se quando eu tinha 3 anos e, talvez por isso, acabou por ser uma relação distante. Já os meus avós maternos foram essenciais na minha vida: o Joaquim e a Isaura. O meu avô morreu quando eu era pequena (devia ter uns 7 ou 8 anos) mas a minha avó morreu quando era adolescente. Foi o primeiro duro golpe na minha vida.

Que importância tiverem os seus avós na sua vida?

Sónia Morais Santos: Os maternos tiveram muita importância. O meu avô tinha um olhar doce e lembro-me de me sentir protegida quando estava com ele. Dizia sempre “a menina”, quando se referia a mim, “cuidado com a menina”, “a menina tem fome”, etc, e isso fazia-me sentir especial. A minha avó era muito trabalhadora e cuidou de mim desde pequena. Não foi carinhosa como mãe mas acho que, comigo, conseguiu encontrar uma reserva de carinho que nem sabia ter. Dava-me conselhos sábios sobre a vida e até sobre os namoros. Quando a minha mãe ralhava, ela defendia-me e, às vezes, escondia certos acontecimentos para me proteger. Fazia-me sempre bife com batatas fritas, muitas batatas fritas caseiras como jamais tornei a comer. Deu-me a primeira Barbie, depois de meses de pedidos, e foi dos presentes que mais gostei de receber (também por ter sido sofrido). Ensinou-me (tal como a minha mãe) o valor do trabalho e a nunca parar de procurar novas formas de ganhar dinheiro e de nos tornarmos úteis. A minha avó entristeceu quando o meu avô morreu e isso foi estranho para mim porque eles passavam a vida às turras. Acho que compreendi, a partir daí, que o amor pode existir mesmo nas relações mais rabugentas. A minha avó passou a chorar todos os dias, quando o meu avô morreu. Acho que chorou todos os dias até morrer. E eu queria muito alegrá-la e, por isso, passei a fazer piadas diárias para lhe arrancar sorrisos. Quando conseguia, ganhava o dia. Doía-me muito vê-la chorar. Quando ela morreu, ouvi durante meses a chave rodar na fechadura, à hora a que ela costumava entrar. Foi a primeira vez que me senti mesmo muito sozinha.

Que características sente ter herdado dos seus avós?

Sónia Morais Santos: Sem dúvida nenhuma, a capacidade de trabalho.

Quais as memórias mais antigas que tem com os seus avós?

Sónia Morais Santos: Lembro-me de ir para a horta com o meu avô. Lembro-me de tentar ensinar a minha avó a ler e a escrever. Lembro-me de dar comer aos coelhos e às galinhas – eles moravam em Sete Rios mas tinham um quintal com animais e uma horta grande.

Os seus avós ajudaram-na a ser o que é hoje?

Sónia Morais Santos: Sim, claro.

Fale-nos da sua infância ( onde vivia,que sonhos tinha …)

Sónia Morais Santos: Vivia em Benfica, com a minha mãe. De 15 em 15 dias ia passar o fim-de-semana com o meu pai e a minha boadrasta (como lhe chamo). Em Benfica, brincava muito na rua, com os amigos. Tinha muitos amigos que eram vizinhos e a vida era uma festa. Uma das brincadeiras era a ser jornalista e a fazer jornais. Ia vendê-los para a rua, a seguir.

Quando decidiu seguir o curso de jornalismo? Era uma carreira com a qual sonhava?

Sónia Morais Santos: Sempre quis ser jornalista. Depois houve uma fase em que quis seguir publicidade, andava fascinada com o mundo dos anúncios e com a criatividade. Mas um professor do curso (que era Ciências da Comunicação e que, só no ultimo ano é que se decidia se se ia para jornalismo ou publicidade) disse-me que eu era jornalista da cabeça aos pés e que tinha absolutamente de seguir esse caminho. Agradeço-lhe até hoje: obrigada, professor Mário Figueiredo!

Foi mãe do seu primeiro filho aos 28 anos, aos 41 voltou a ser mãe pela 4º vez. Quais as diferenças entre ser mãe antes dos 30 e depois dos 40 anos?

Sónia Morais Santos: Quando se é mãe pela primeira vez, quer-se ser perfeita. Tinha sonhos incríveis, de pôr o miúdo no circo, de lhe dar uma educação diferente, fora da caixa, de estimular a sua criatividade, de…de…de… O primeiro filho é tipicamente aquele que vai ver todos os filmes infantis que surgem, que vai a todas as peças de teatro, workshops, ateliers… Queremos estimular a sua inteligência, queremos que seja incrível. Acho que a grande diferença é a da compreensão da realidade: não podemos ser perfeitas e o melhor é assumir isso e tentar fazer o melhor que se pode. O facto de ter 4 filhos permite uma descontração que me agrada. Praticamente não dramatizo nada, simplesmente deixo fluir. O quarto filho traz um cansaço muito diferente do que sentia com o primeiro (a idade não perdoa) e também uma certa “moleza” na educação: com o primeiro era tudo certo: dormia na cama dele, aos 6 meses estava no quarto dele, não dava demasiado colo, era tudo como devia ser. Agora? Quero nem saber. O Mateus dormiu connosco nos primeiros meses, dou-lhe todo o colo e, à beira de fazer 6 meses, não estou nada a ver-me a mandá-lo para outro quarto… Digamos que sou um bocadinho mãe-avó.

O Manuel tem 13 anos o Mateus cerca de 6 meses, entre estes dois tem o Martim com 9 anos e a Madalena com 5. Como é a logística de uma mãe de 4 filhos?

Sónia Morais Santos: É louca. Às 9h da manhã já estou capaz de me deitar para dormir outra vez, tal o cansaço! Mas é ao final do dia que a coisa se torna caótica. Todos os dias há actividades: inglês, ténis, futebol, guitarra, natação. Há dias em que tenho de levar um, levar outro, ir buscar ambos… ando sempre a correr. Pelo meio trabalho a alta velocidade, para conseguir fazer tudo!

Tem  tempo para “desligar”? Alguma vez sente-se a anular como mulher, para ser mãe, mulher, filha, profissional bem sucedida …? Ou a soma destas coisas é que a realizam como mulher?

Sónia Morais Santos: Desligo quando corro. Ou quando jogo Padel. São os meus momentos. Sempre que me sinto a anular num desses campos, reoriento tudo para que isso não aconteça. Com todo o respeito que tenho pelas mães que optam por sê-lo em exclusivo, para mim seria impossível. Só me sinto mulher realizada quando trabalho e, sobretudo, quando trabalho muito. E não me pergunte como nem porquê mas a verdade é que quanto mais trabalho melhor mãe sou. Acho que tem a ver com a tal realização. Quanto mais realizada me sinto, mais feliz estou, mais equilibrada e, logo, mais disponível para ser mãe.

Com uma casa com 4 filhos, uma marido, um cão … um blogue  de sucesso … quando olha para a sua vida, é a vida com a  qual sonhou?

Sónia Morais Santos: Sem dúvida. Se melhorar, estraga. (risos)

Como se dão os irmãos entre si? Ajudam? 

Sónia Morais Santos: Dão-se bem e mal. Os dois rapazes mais velhos passam a vida entre o amor e o ódio. Sei que se adoram mas são viciados em implicar. Acho que é normal. Ela é a princesa, mimada por todos e muito doce, sempre à procura de quem brinque com ela, de quem lhe dê atenção, de quem a mime. O bebé… é só um bebé, mas já cheio de personalidade porque sempre que um deles o aperta, ele guincha como que a pedir ajuda. O Manel é quem me ajuda mais. Ajuda muito. Vai buscar coisas, toma conta do bebé para eu trabalhar, ajuda nas coisas da casa, vai às compras… O Martim também , mas o Manel é de facto uma grande ajuda. A Madalena adora mudar a fralda ao Mateus.

E o pai? É um pai sempre cooperador? Dividem as tarefas?

Sónia Morais Santos: O pai faz tudo o que eu faço, não há rigorosamente diferença nenhuma. Banhos, jantares, loiça… tudo é feito pelos dois. Se não fosse assim, duvido que tivesse 4 filhos.

Há uns anos tinha criado o DFU ( dia do filho único), dia em que juntamente com o seu marido, ia buscar um dos seus filhos à escola, e fazia um programa só com ele. O DFU ainda existe ou implementou outra estratégia?

Sónia Morais Santos: Existe, existe. Nem sempre é possível ser mesmo DFU… por exemplo, na semana passada o Martim tinha pedido para ir almoçar com ele, mas nunca mais insistiu e eu esqueci-me. Entretanto, a Madalena começou a pedir mas, como é muuuuuuuito insistente, combinei ir almoçar com ela. O Martim ouviu e ficou incrédulo: “Mas eu pedi primeiro!!!!” A maneira foi perguntar se se importavam de ir os dois. Ficaram todos contentes e foi um DFU… a dois. 🙂 Mas continuamos a fazer e achamos perfeito!

(Continua…)