Retratos Contados João Didelet

Retratos Contados do ator

João Didelet

 

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Retratos Contados (R.C): João Didelet faz-nos uma pequena apresentação tua.

João Didelet (J.D): Nasci nos idos anos de 1964, no dia 13 de Outubro, não sei se era uma Sexta-feira e se havia gatos pretos à volta e essas coisas… Era dia de Nossa Senhora de Fátima e continua a ser. Nasci em casa, embora naquela altura já se nasce-se na maternidade. Mas eu nasci em casa, onde vivi muitos anos, passei lá a minha infância, naquela casa na Rua Damião de Góis, que fica no fim de Lisboa e no princípio de Algés. Tive uma infância normal, criança brincalhona, gostava de pregar a sua partida, divertir-me, embora os outros às vezes podiam não gostar.

 

R.C: Filho único?

J.D: Não! Sou o filho mais novo. Houve uma primeira fornada de 3 seguidos, que foram 2 rapazes e uma rapariga, 9 anos e meio depois nasci eu. Portanto, éramos bastantes em casa. Era uma festa. Os meus irmãos já queriam fazer outras festas e eu estava de fora da festa, mas sempre em festa. Era o filho não desejado…9 anos depois? Não, era do género como já eu tinha consciência das coisas eu queria andar sempre com os meus irmãos, evidentemente. Eles às vezes é que não queriam andar comigo e então arranjavam histórias que queriam sair e eu: “Vamos sair, vamos sair” e eles “Ah vamos ficar mais um bocadinho” “Oh João vai lá ali ver não sei quê, vai lá ali buscar não sei quantos” .Eu ia todo contente, quando voltava já não estava ninguém em casa.

(RISOS)

 

R.C: Portanto mistos traumas de infância… (risos)

J.D: Muito traumatizado! Anos de psicólogos…Foi terrível, foi terrível. Por isso é que eu vim para o teatro.

 

“Uma das coisas que nos entretínhamos era assaltar a despensa da minha avó, sem ela saber claro.”

 

 R.C: João, em relação aos teus avós, que recordações é que tens deles?

J.D: Eu só conheci as minhas avós. O meu avô materno nem cheguei a conhecê-lo, o meu avô paterno morreu quando eu tinha 9 meses. Agora das minhas avós tenho recordações. A minha avó de Alcácer do Sal tinha um edifício que tem 3 andares, Eles tinham 3 filhas, o meu avô tinha uma casa térrea e resolveu fazer um prédio para cada filha ficar com um andar. Eu lembro-me de ir para lá e eu e os meus primos. Uma das coisas que nos entretínhamos era assaltar a despensa da minha avó, sem ela saber claro. Depois também lembro-me da minha avó ir buscar leite fresco, na altura ainda era leitinho da vaca, oferecer dinheiro para irmos jogar matraquilhos, para não a chatearmos. Íamos jogar matraquilhos lá para a leitaria. A minha avó materna é que vivia em Alcácer do Sal e eu lembro-me mais de lá ir de férias…

A minha avó paterna vivia connosco. Estava sempre connosco, muito afeiçoada à limpeza, que às vezes para os miúdos era um bocado chato. A gente chegava a casa e a primeira coisa que ela dizia era ”Vai lavar as mãos!”. A gente começava a arranjar truques que era punha a água a correr e fechava e dizia ”Já está!”

 

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R.C:E ela descobria ou nem sempre?

J.D: Às vezes fazia de conta que não percebia, mas acho que percebia perfeitamente o que estava a acontecer, mas depois pronto…era avó; Era muito paciente connosco, aparava-nos muitos jogos, dava-nos muitos mimos.

Nuca trabalhou fora de casa, o meu avô é que trabalhava e era o sustento da casa e ela estaria sempre por casa a tratar das coisas. Depois quando foi viver connosco, após o  meu avô ter falecido em vez de ter ficado a viver sozinha. Eles viviam em Vale de Lobos que é ao pé de Belas, tínhamos lá uma quinta na altura.

 

“A minha avó falava muito do meu avô.”

 

R.C:Que recordações dos teus avôs as tuas avós te passaram?

J.D: A minha avó falava muito do meu avô. É engraçado que dela lembro-me por exemplo desta história dela; Que uma vez o meu avô deixou crescer o bigode e enquanto ele não cortou o bigode ela não lhe deu um beijo. A minha avó era assim. Mas ao mesmo tempo, falava muito dos meus avô, que se ele fosse vivo que ia gostar muito de me acompanhar, porque eu depois jogava râguebi, ia para aqui, para ali. Ia ser um avô muito companheiro, e falava com bastante carinho do meu avô e é engraçado porque acabou por ser uma pessoa, um ausente, presente, no fundo através das memórias da minha avó. A minha avó Adelaide era mais prática, mais terra a terra, era uma vivência diferente, era uma mulher mais independente, tinha a sua vida, ela sim trabalhou, geriu um negócio que havia lá na família. Era um bocadinho diferente, não era tanto de dar carinhos, não é que não gostasse de nós, tinha a ver com a personalidade. Não falava muito do meu avô, não era muito de conversar. Era uma avó mais fechada, mais virada para o lado prático.

 

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R.C: Qual é que é a importância dos avós na vida do teu filho?

J.D: O João tal como eu, só conhece as avós, não conheceu os avôs. É engraçado, porque a minha mãe vive mais perto de nós, sempre que pode vai lá a casa, ou nós fazemos uma visita, e o João Miguel é muito agarrado à família desde muito cedo, apesar de ,ao principio não via tantas as avós, mas reconhecia-as logo e acho que havia ali qualquer coisa que lhe fazia um “clic” .Depois a mãe da Andreia vive na Verdizela, do outro lado do rio e tem uma vivenda, como tem ali um terreno, tem cães e o João adora ir para lá porque há ali um contacto maior com a Natureza.

 

R.C: Que idade tem o João?

J.D: Tem 2 anos e 9 meses, quase 3 anos. Acontece que a casa da avó materna, é onde o João, tem os primos para brincar, é um sitio de festa, um sitio de contacto com a natureza ,os cães… como também o irmão da Andreia tem 2 filhos com idades mais próximas da idade do João é um sitio onde nos encontramos todos. A minha mãe não tem estas condições, mas é uma avó é muito afetuosa com o João também se sente muito bem. As avós são uma referência para ele.

 

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R.C:  E as avós com os netos?

J.D: As avós com os netos, são umas avós babadas. Isto também é um caso especial. ;A minha mãe  já tinha netos, filhos dos meus irmãos, e já estava a achar que nunca iria ter um neto meu. Quando o João apareceu ficou muito contente, ficou super feliz e a mãe da Andreia também . Lá está já nos tínhamos convencido todos que não íamos ter filhos , mas aconteceu e foi uma grande alegria, não estava nada à espera .Quase que a primeira reação foi: “Não? É mentira!”

(RISOS)

 

R.C: É muito frequente ouvirmos na televisão noticias sobre a violência sobre os idosos, os idosos que são abandonados… Quando ouves noticias deste género o que é que sentes?

J.D: Faz-me bastante confusão, uma das coisas que nós tentámos foi precisamente com a minha avó foi que ela ficasse sempre em casa e a parte final da vida dela. Não é fácil para ninguém porque ela foi perdendo a mobilidade e faculdades mas foi sempre uma coisa que nós achámos que era…era o espaço dela e acho que é importante estar na família, porque tínhamos essa hipótese também. Conseguimos o meu pai estar lá conseguimos depois também rodar entre nós e ajudar ,mas faz-me confusão porque na realidade são pessoas que estão vulneráveis e é fácil exercer poder ou violência sobre quem está vulnerável, sobre quem não tem capacidades para se defender . É como com as crianças, não é ?. Acho um acto de muita cobardia ,falta de princípios, humanidade …

 

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Agradecimentos: Yellow Star Company